NOTA INFORMATIVA 3 - AGIR E INTEGRAR
Definir e implementar ações para abordar questões de direitos humanos
Conteúdo
IIIIIII 1 Conceito de agir e integrar
IIIIIII 2 Entender a relação com o dano
IIIIIII 3 Como abordar e integrar questões de direitos humanos nos processos da empresa?
IIIIIII 4 Considerações sobre grupos vulneráveis
IIIIIII 5 Desafios e recomendações
IIIIIII 6 Checklist
IIIIIII 7 Biblioteca de ferramentas
Objetivo da nota informativa
Esta nota informativa apresenta informações sobre como planejar ações para abordar os riscos e impactos aos direitos humanos em operações próprias e na cadeia de fornecimento. A nota traz orientações sobre como entender a relação e a influência da empresa sobre impactos em direitos humanos, e como estabelecer e implementar um plano de ação.
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Conceito de agir e integrar
Uma vez levantados os riscos e impactos nos direitos humanos, e após a priorização dos impactos a serem abordados, o seguinte passo é pensar em como agir em relação ao que foi identificado. Isso inclui remediação de impactos reais, caso necessário, e integrar considerações de direitos humanos em processos e sistemas já existentes a fim de reduzir a possibilidade de reincidência do risco/impacto. Isso significa:
1. Desenvolver ações para abordar as causas raízes identificadas das questões mais salientes – AGIR
Resumidamente, AGIR consiste na definição de planos de ação para prevenir, mitigar e remediar riscos e impactos sobre os direitos humanos identificados incluindo atividades previstas, cronograma de implementação, responsabilidades, indicadores para monitoramento da implementação das ações e sua eficácia e alocação dos recursos necessários. Os planos de ação podem estar organizados em um documento, uma série de documentos ou um “roadmap”. Os planos podem ser integrados à um plano de ação mais amplo, ou ser específicos para direitos humanos.
2. Revisar e aprimorar os sistemas internos existentes para prevenir e mitigar os problemas mais salientes - INTEGRAR
INTEGRAR consiste na incorporação pela empresa do respeito aos direitos humanos em todos os aspectos de sua governança e operações para abordar as principais lacunas identificadas e a fim de evitar a ocorrência ou reincidência de riscos e impactos em direitos humanos.
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Entender a relação com o dano
Para pensar os planos de ação em si, a empresa precisa considerar sua relação com o dano, que pode ocorrer de diferentes maneiras:
Causar o dano, sendo resultado de uma ação direta da empresa, ou então de sua inação. Geralmente, a empresa é a única responsável pelo dano.
Contribuir para o dano, juntamente com outras empresas ou atores. Nesse caso, a empresa possui um papel de facilitador, incentivando ou motivando o dano.
Estar vinculado ao dano. Nesse caso, um outro ator está causando ou contribuindo para o dano, mas possui uma relação de benefício comercial com a empresa.
Cada tipo de relação com o dano gera uma necessidade de ação diferente, conforme o esquema abaixo.
ATENÇÃO - É importante lembrar que as causas raízes identificadas indicam o que está de fato provocando aquele risco/impacto e, portanto, ajudam a entender a dimensão do problema, se o impacto é pontual ou sistêmico, e a definir o tipo de ação e engajamento a ser realizado.
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Como abordar e integrar questões de direitos humanos nos processos da empresa?
A. Planejar a ação
Primeiramente, é avaliado se o impacto identificado fere procedimentos operacionais já existentes ou cláusulas contratuais entre a usina e o fornecedor. Isso garante a confiabilidade do plano ou da política, assim como o compromisso da empresa sobre o dano. Nesse caso, a empresa deve seguir o que está definido em seu procedimento interno para ação, considerando as responsabilidades internas.
Caso seja necessário aprofundar-se no tratamento dos riscos e impactos em direitos humanos identificados é importante pensar o escopo adequado para ação com potencial de trazer resultados mais eficazes:
a. dentro da própria operação da empresa, implementando-a de maneira mais direta;
b. dentro da cadeia de fornecimento, seja exigindo ações por parte de um ou mais fornecedores ou apoiando-os na resolução da questão;
c. dentro de um escopo de maior abrangência e colaboração para questões mais sistêmicas, em alguns casos, para além de sua cadeia de fornecimento.
Muitas vezes, para que um impacto ou risco seja abordado de maneira eficaz, será necessário agir dentro de diferentes escopos!
a) Ações em operações próprias
São ações relacionadas a sistemas e processos internos da empresa, incluindo atores diretamente envolvidos na operação do negócio, como colaboradores e trabalhadores subcontratados.
Usinas de cana-de-açúcar, normalmente, possuem procedimentos internos bastante estruturados para questões relacionadas a produção agrícola e industrial, identificação de riscos laborais e promoção da saúde e segurança dos trabalhadores, e de boas práticas ambientais (como descarte e tratamento de resíduos, gestão de recursos hídricos etc.). Esse tipo de conhecimento pode ser aproveitado na Devida Diligência para integrar demais questões de direitos humanos. Além disso, o processo de estruturação e implementação de tais procedimentos e sistemas internos são também fomentados pelas diversas certificações existentes no setor, muitas das quais abordam questões de direitos humanos. Por exemplo:
Bonsucro: inclui critérios relacionados a avaliação e gestão de riscos sociais; respeito a direitos trabalhistas e padrões de segurança e saúde ocupacional; processos de melhoria contínua
SMETA: inclui padrões de trabalho, saúde e segurança, desempenho ambiental e ética em operações próprias ou de fornecedores (a depender do escopo da auditoria). Ajuda a proteger os trabalhadores contra condições inseguras, excesso de jornada de trabalho, discriminação, baixos salários e trabalho forçado.
ISCC: inclui critérios relacionados a condições seguras de trabalho; direitos humanos, trabalhistas e fundiários e relações comunitárias responsáveis; conformidade com as leis aplicáveis e tratados internacionais relevantes; e boas práticas de gestão e compromisso com a melhoria contínua
Adicionalmente, o Brasil possui um arcabouço legal relativamente robusto, que contribui para a promoção de melhores condições trabalhistas no setor, como é o caso da Norma Regulamentadora (NR) no. 31. Essa lei é aplicável às atividades de agricultura e trata das “disposições legais e regulamentares sobre segurança e saúde no trabalho rural, de forma a garantir adequadas condições de trabalho, higiene e conforto, e adotar medidas de prevenção e proteção para garantir que todas as atividades, locais de trabalho, máquinas, equipamentos e ferramentas sejam seguros”. Portanto, as empresas devem garantir que seus procedimentos e atividades estejam em conformidade com a norma em questão.
Procedimentos e sistemas internos, certificações e arcabouços legais ajudam na redução dos riscos relacionados a ocorrência de impactos em direitos humanos, por fomentarem uma melhor incorporação dessas questões dentro da empresa. Ainda assim, possuem alguns fatores limitantes:
Nem sempre todas as questões mais salientes em direitos humanos do contexto operacional da usina estão cobertos por essas ferramentas.
Comumente, estão mais focados em operações próprias ou abrangem apenas parte de áreas de fornecedores, podendo haver então um espaço de menor visibilidade de impactos em direitos humanos para fornecedores.
Podem não incluir de maneira eficaz um processo de consulta com todas as partes interessadas ou afetadas relevantes, além de não trazer visibilidade para grupos vulneráveis específicos.
Os pontos limitantes acima mencionados (dentre outros) devem ser endereçados através da abordagem mais ampla e contínua da Devida Diligência em Direitos Humanos.
b) Ações dentro da cadeia de fornecimento
São ações que visam apoiar melhorias nas práticas de direitos humanos do fornecedor e/ou em seus sistemas de gestão de riscos e impactos em direitos humanos. A empresa pode, por exemplo, exigir ação por parte do fornecedor com prazos claros para resolução e apoiá-lo na resolução da questão.
Quando uma empresa está vinculada ou contribui para um impacto em sua cadeia de fornecimento, precisa avaliar a influência que possui sobre a outra parte (por exemplo, o fornecedor). Também deve considerar o nível de risco do fornecedor, tanto em termos de riscos geográficos (referente à onde o fornecedor está localizado/atua) quanto de riscos decorrentes de seus sistemas imaturos ou inexistentes para gestão de questões de direitos humanos. Finalmente, precisa ser considerado os tipos de engajamento existente com o fornecedor.
Essas informações, elaboradas em mais detalhes abaixo, podem ser utilizadas para definir o conjunto adequado de ações.
Sua relação com o ator responsável pelo dano: averiguar qual a relevância desse fornecedor para sua estratégia de compras (localização geográfica, qualidade do produto fornecido, ser o comprador principal do produto do fornecedor etc.); histórico das relações comerciais (tempo de relacionamento, tipos de contratos – curto ou longo prazo etc.); dentre outros fatores.
Considerar quais são as principais características de fornecedores de cana-de-açúcar e sua relação com usinas. Por exemplo:
Tipos de contratos existentes entre a usina e o fornecedor:
Contratos de mais longo prazo normalmente indicam uma relação mais próxima entre usina e fornecedor, acompanhada de um maior poder de influência. Contratos spot ou de curto prazo estão mais susceptíveis a mudanças e, portanto, podem indicar um menor poder de influência por parte da usina.
Relevância do volume total comprado em relação ao volume total produzido pelo fornecedor
Quanto maior a quantidade de volume comprada pela empresa em relação ao volume total produzido/comercializado pelo fornecedor de cana de açúcar, maior é o poder de influência da empresa em relação a esse fornecedor. Nesses casos, os vínculos comerciais tendem a ser mais fortes.
O Nível de risco do fornecedor: averiguar qual o risco desse fornecedor, conforme explicado na Nota Informativa 2.
Tipos de engajamento existentes: entender que tipos de engajamento com fornecedores e demais atores já existem e determinar se são necessárias adaptações aos já existentes ou se é necessário estabelecer novas formas de engajamento/ mecanismos de influência.
Seguem abaixo alguns exemplos de diferentes tipos de engajamento com fornecedores:
ATENÇÃO - Cláusulas contratuais não podem ser usadas como uma legítima alegação de não-responsabilidade. O processo de devida diligência para empresas foi construído para abordar abusos de direitos humanos em toda a cadeia de fornecimento, e empresas que estão contribuindo ou vinculadas ao dano, frequentemente por meio de uma relação comercial, têm uma responsabilidade clara e compartilhada sobre eles.
Exemplos de programas próprios de empresas para engajamento de fornecedores no setor sucroenergético no Brasil:
Esses programas atuam junto a produtores de cana-de-açúcar para promover melhorias contínuas em seus sistemas de gestão e desempenho em questões de sustentabilidade social e ambiental.
Programa ELOS[1], da Raízen: o programa cobre questões relevantes dentro da temática de direitos humanos - contratação de mão de obra e empregados próprios, questões trabalhistas, prestadores de serviço, prevenção de riscos e acidentes, dentre outros. Apoia produtores de cana-de-açúcar através de eventos, palestras e treinamentos, incentivo ao uso de tecnologias, e acompanhamento técnico.
Programa VIVE, da Czarnikow: abrange toda a cadeia de fornecimento da cana-de-açúcar, incluindo a fazenda, usina, refinaria, e transportadores e trouxe melhorias significativas em questões de direitos humanos, como:
Contratos de trabalho: formalização dos contratos de trabalhadores de prestadores de serviços terceirizado; estabelecimento de contratos claros e justos; inclusão de cláusulas contratuais importantes, como a de pagamento mensal.
Trabalho infantil: inclusão de idade mínima para contratação em políticas de prevenção do trabalho infantil
Saúde e Segurança – Ruídos no local de trabalho: adoção de medidas de proteção auditiva adequadas e incentivo para redução do ruído na fonte, sendo o uso do Equipamento de Proteção Individual um último recurso (caso a solução anterior não seja suficiente)
Saúde e Segurança – Equipamentos de Proteção Individual (EPI): treinamentos para melhorar o manuseio, armazenamento e uso de agroquímicos; desenvolvimento de plano para aumentar o uso futuro de EPIs; fornecimento de EPIs adequados.
Para além das empresas, existem outros atores, como associações de produtores ou sindicato de trabalhadores, que estabelecem programas próprios para engajamento de fornecedores, apoiando-os na definição de compromissos mais robustos em direitos humanos, no monitoramento da implementação desses compromissos e nos processos de melhoria contínua.
c) Agir além da cadeia de fornecimento
Para questões mais sistêmicas do setor, é importante considerar também ações de maior abrangência e colaboração, para além da cadeia de fornecimento. Isso inclui ações em uma área de produção, a nível de paisagem, jurisdicional[2], ou setorial, e/ou engajamento com governos ou órgãos públicos (nacionais ou regionais). São ações que geralmente envolvem um grupo diverso de atores a fim de abordar questões que necessitam de esforços de diferentes atores para alcançar a mudança desejada. É importante ressaltar que essas ações devem ser complementares aos esforços dentro da cadeia de suprimentos.
Para abordar questões específicas de direitos humanos no setor sucroenergético, é importante trabalhar coletivamente e unir esforços com iniciativas já existentes, especialmente aquelas já trabalhadas pela sociedade civil, que podem ser aproveitadas para abordar questões sistêmicas. Caso esses espaços não enderecem tais questões de maneira adequada, é possível promover novos espaços ou iniciativas.
Exemplos de ações específicos para usinas de cana-de-açúcar no Brasil
B. Engajamento de partes interessadas (internas e externas) relevantes
É importante que o processo para desenvolver o plano de ação engaje as equipes internas necessárias e partes interessadas relevantes dentro de temáticas específicas. Vide exemplos abaixo:
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Existem procedimentos para garantir que os direitos dos povos indígenas e de comunidades tradicionais sejam ouvidos e respeitados e que o Consentimento Livre, Prévio e Informado (FPIC) seja implementado?
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Existe um procedimento adequado para consulta com partes interessadas para identificar os riscos e impactos sobre as pessoas?
Estudos de impacto ambiental e social foram realizados e são revisados regularmente por uma empresa idônea e confiável, sem conflito de interesses?
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As práticas de recrutamento estão alinhadas com o recrutamento ético? Por exemplo, nenhuma taxa é paga pelos trabalhadores, as contratações são neutras em relação ao gênero; incluindo prevenção e mitigação de riscos relacionados ao trabalho forçado e infantil; livre de discriminações.
Os mecanismos disponíveis para consulta e participação dos trabalhadores (independente de sexo, cor e raça, nacionalidade, idade, etc.) são eficazes?
Os mecanismos disponíveis para consulta e participação dos trabalhadores e demais partes interessadas consideram diferenças culturais e linguísticas relevantes (principalmente no caso de trabalhadores migrantes, imigrantes ou analfabetos)?
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As práticas de compras e precificação garantem uma renda suficiente para sua subsistência e de sua família?
As metas de produção são realistas?
Os direitos dos trabalhadores dos pequenos produtores são respeitados?
Existem canais de comunicação seguros e inclusivos entre esses atores e a empresa?
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Existem canais de comunicação bidirecionais estruturados para identificar e agir sobre os riscos com antecedência?
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As práticas de gerenciamento de culturas protegem a saúde dos trabalhadores e os recursos naturais do entorno (cursos de água, solo, vegetação, biodiversidade etc.)?
C. Implementação do plano de ação
As ações a serem tomadas são organizadas em um plano de implementação com prazo determinado. No mínimo, o plano deve cobrir quais ações serão executadas, quem são os responsáveis por implementá-las e quando serão executadas.
A definição das ações envolve o planejamento de ações para corrigir, prevenir, mitigar e remediar o dano, priorizando aquelas de maior risco para pessoas, além dos indicadores e métodos de monitoramento de sua implementação. A atribuição de responsabilidades visa fomentar a construção do apoio interno dentro da organização e conectar o processo de tomada de decisão com demais membros da equipe. Por fim, o desenvolvimento do cronograma de implementação inclui a definição de metas internas e externas com prazos definidos e objetivos de longo prazo, com base no conhecimento do contexto operacional da empresa e de sua cadeia de fornecimento.
O uso eficiente dos recursos é fundamental e deve considerar as causas raízes e o impacto esperado para prevenir e mitigar o dano ou risco a partir de um conjunto das ações. O plano de ação deverá ser aprovado pela direção da empresa e cascateado para os responsáveis por sua implementação. Em caso de impactos reais graves, é necessário tomar medidas imediatas a fim de saná-lo imediatamente e evitar maiores danos aos atores afetados.
D. Integrar o respeito aos direitos humanos
Em muitos casos, impactos em direitos humanos por parte de uma empresa podem estar relacionados a inexistência ou imaturidade de sistemas e procedimentos internos da empresa (como práticas de recrutamento ético, procedimentos de saúde e segurança etc.). Portanto, o podem ser abordados por meio do desenvolvimento ou aprimoramento de tais sistemas e procedimentos para garantir que o respeito aos direitos humanos seja integrado aos sistemas internos e à governança da empresa. Algumas medidas a serem adotadas são:
Construção de uma cultura empresarial ética. Isso inclui integrar o respeito pelos direitos humanos nas políticas, sistemas, processos e mecanismos das empresas e em departamentos diversos como equipe de compras, gestão da cadeia de fornecimento, jurídico, dentre outros.
Integração de ações e indicadores a processos já existentes, incluindo aqueles desenvolvidos para fins de monitoramento de riscos ambientais, por exemplo.
Promoção da responsabilidade compartilhada de respeito aos direitos humanos e entrega dos compromissos em todos os departamentos, promovendo a adoção de um enfoque mais integral em suas ações. Por exemplo, o departamento de sustentabilidade estabelece ações e iniciativas para apoiar os fornecedores oferecem melhores condições de trabalho, mas a equipe comercial continua a comprar volumes de fornecedores com histórico de más condições trabalhistas e que não demonstram comprometimento em fomentar melhores condições trabalhistas.
[1] Maiores informações sobre o programa ELOS podem ser encontradas na página 77 do Relatório Integrado 2022/2023 da Raízen
[2] A definição de iniciativas jurisdicionais ou em escala de paisagem podem ser encontradas em: bn02_rsp_portuguese_final_mid-res.pdf (proforest.net)
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Considerações sobre grupos vulneráveis
Como garantir que seja dada visibilidade adequada a atores invisibilizados ou em situação de vulnerabilidade dentro da Devida Diligência?
A consulta a atores afetados ou em risco é um requisito da abordagem da Devida Diligência em Direitos Humanos. No entanto, é muito comum haver casos de determinados grupos vulneráveis que não sejam devidamente contemplados nessas etapas participativas. Portanto, é necessário:
Mapear quem são os atores potencialmente invisibilizados nesse processo considerando os aspectos específicos como gênero, nacionalidade, idade, raça e cor, entre outros.
Por exemplo, se a maior parte dos trabalhadores de uma usina forem homens com família constituída, é possível pensar de que maneira as condições trabalhistas e de moradia afetam os membros de sua família. Por exemplo, os turnos de trabalho permitem uma divisão equilibrada das responsabilidades domésticas, evitando uma sobrecarga para mulheres da família? As crianças têm acesso e frequentam ambientes educacionais de nível infantil e fundamental? No caso de mulheres migrantes, estariam elas mais suscetíveis à violência moral, física e/ou sexual?
Considerar possíveis dinâmicas de poder existentes que possam vir a “silenciar” ou “inibir” a participação efetiva de tais grupos.
Por exemplo, trabalhadores estrangeiros têm menor propensão de comunicar de maneira efetiva os seus interesses por risco de represália, de estigmatização ou pela dificuldade de entender e ser entendido.
Pensar em estratégias específicas para inclusão desses atores nos processos de consulta a partes interessadas, garantindo uma maior representatividade de tais grupos. A inclusão aqui deve ir além de participação em número, mas entender quais dinâmicas impedem determinados grupos participar ativamente do processo.
Por exemplo, os horários nos quais as consultas são realizadas podem impedir uma maior participação das mulheres, já que elas podem estar ocupadas com o trabalho doméstico e familiar. O transporte e acesso às reuniões também pode ser revisto, considerando que pode haver fatores limitantes para alguns grupos chegarem ou saírem do local indicado.
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Desafios e recomendações
Fornecedores não cooperativos: o que fazer?
A falta de colaboração de fornecedores pode ser um fator limitante no endereçamento de riscos e impactos em direitos humanos. Portanto, uma primeira medida para minimizar os riscos de uma possível falta de colaboração de fornecedor é garantir que eles estejam devidamente incluídos no processo de devida diligência.
O fato de os fornecedores estarem mais próximos do início da cadeia facilita o acesso a atores afetados e em risco, trazendo uma visibilidade importante para o processo de devida diligência sobre riscos e impactos a nível de produção aos quais esses atores estão sujeitos. Isso permite uma avaliação mais precisa sobre o que de fato está acontecendo a nível de produção, a qual irá informar o processo de definição das ações.
Durante o processo de definição de ações é importante garantir um espaço para construção conjunta dos planos de ação, abrindo um espaço de escuta para o fornecedor e demais atores afetados ou potencialmente afetados. Isso permite um maior engajamento das partes interessadas e apropriação dos planos de ação definidos.
Além disso, é importante identificar situações nas quais o fornecedor não tenha a capacidade necessária para abordar determinado impacto e, portanto, precise de um apoio maior da empresa para implementar as ações necessárias ou seu suporte na identificação e articulação com outros potenciais parceiros.
Destaca-se também a importância de ações tomadas no âmbito setorial, pois essas têm potencial de alcançar todos os elos da cadeia. Quando o setor adota medidas de proteção aos direitos humanos, amplia-se o poder de influência e apoio entre os membros, fortalecendo a capacidade individual de adequação.
ATENÇÃO - Mesmo em casos de fornecedores não cooperativos, a exclusão do fornecedor da cadeia de fornecimento deve ser sempre o último caminho a ser seguido, em casos extremos de falta de interesse e colaboração na resolução do problema e tendo exaurido todas as demais opções de engajamento e colaboração possíveis. A intenção é que o dano seja abordado de maneira adequada, e não ignorado. Além disso, a exclusão de um fornecedor não retira da empresa a responsabilidade de resolver o dano e pode dificultar a sua resolução, caso o poder de influência seja reduzido.
Prestadores de serviços: falta de controle e visibilidade de práticas relacionadas aos direitos humanos.
A empresa contratante tem a responsabilidade de conhecer os riscos em sua cadeia de fornecimento e a falta de conhecimento não pode justificar sua inação perante esses riscos e impactos.
Isso inclui identificar impactos e riscos aos direitos humanos em operações próprias e nas operações de fornecedores e prestadores de serviço para prevenir, mitigar e remediar (quando necessário) tais impactos. A empresa precisa garantir, por exemplo, que os trabalhadores terceirizados tenham seus direitos trabalhistas respeitados, que possuam condições dignas de trabalho, que tenham acesso gratuito à segurança no trabalho, incluindo a obrigatoriedade de acesso gratuito e uso de Equipamentos de Proteção Individual necessários, dentre outros.
Dessa forma, é necessário estabelecer processos e mecanismos que permitam um controle mais detalhado e constante desses atores, dando visibilidade às práticas de respeito aos direitos humanos implementadas por fornecedores e prestadores de serviço contratados
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Checklist
✓
A empresa identificou sua
relação com o dano
específicos em diretos humanos?
✓ Se a empresa
causou ou pode ter causado
um impacto: 1) parou a ação danosa; 2) preveniu ou mitigou o impacto; e 3) remediou o dano (se necessário)?
✓
O
plano de ação foi baseado nos resultados da etapa de identificação e priorização de riscos? Foi realizada uma análise de
causas raízes
?
✓ Se a empresa
contribuiu
para um impacto: 1) parou a ação danosa; 2) preveniu ou mitigou o impacto ou usou ou aumentou sua influência para preveni-lo ou mitigá-lo; e 3) remediou o dano (se necessário)?
✓ Se a empresa
está diretamente vinculada
a um impacto, usou ou aumentou sua influência para 1) prevenir ou mitigar o impacto; e 2) remediar o dano ou contribuir para a remediação (se necessário)?
✓
O plano de ação…
✓ ...tem
prazos
claros e realistas?
✓
Para ações em sua cadeia de fornecimento, considerou-se o
tipo de relação existente com o fornecedor, seu nível de risco, e os tipos de engajamento existentes?
✓ ...define as
responsabilidades
para cada ação?
✓ ...está integrado com
sistemas e processos internos
da empresa?
✓ ...inclui
consulta com partes interessadas,
quando necessário?
✓ ...considera os riscos de
invisibilidade de grupos vulneráveis
e endereça-os adequadamente?
✓ ......contempla um
conjunto de ações
para tratar o risco/impacto de maneira adequada, considerando sua(s) causa(s) raiz(es)?
✓ ...define o conjunto de ações necessárias em
diferentes escopos
aplicáveis: operações próprias, cadeia de fornecimento, espaços de colaboração?
✓ Os
recursos para implementação do plano de ação foram alocados de maneira eficiente?
✓ Além de tomar ações específicas para parar o dano, a empresa definiu ações para
incorporar o respeito aos direitos humanos em todos os aspectos de sua governança e operações
para prevenir e mitigar danos futuros ou recorrentes?
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Biblioteca de ferramentas
Nesta seção, você encontrará algumas ferramentas que podem ajudá-lo no processo de agir sobre os riscos e impactos identificados e integrar boas prática em relação a direitos humanos
PRÓXIMO – Nota informativa 4, Monitorar, onde será explorada a temática de monitoramento e avaliação da eficácia das ações implementadas para abordar questões de direitos humanos.
Autodiagnóstico Trabalhista - Governo brasileiro: ferramenta gratuita que se propõe a fornecer informações e conselhos técnicos aos empregadores, trabalhadores e sociedade em geral sobre os meios mais eficazes para promoção do trabalho decente a partir de uma conduta empresarial responsável. Possui versões para o setor rural, micro e pequenas empresas, e grandes empresas e multinacionais.
Análise de Lacunas de Gênero dos Princípios de Empoderamento das Mulheres (Ferramenta WEPs) - Pacto Global da ONU: projetada para ajudar empresas a avaliarem seu desempenho em termos da igualdade de gênero no local de trabalho, no mercado e na comunidade.
Indicadores de direitos humanos para empresas - Instituto Dinamarquês de Direitos Humanos: ferramenta de autoavaliação que ajuda a avaliar e melhorar o nível de maturidade de suas políticas, procedimentos e práticas corporativas.
Gender Due Diligence Assessment (disponível somente em inglês): Ferramenta de autoavaliação desenvolvida pela Win Win Strategies para empresas avaliarem o nível de maturidade de suas políticas e processos internos e cadeia de fornecimento para questões de gênero.
Programa “Escravo, Nem Pensar” : é um programa de formação da ONG Repórter Brasil que se dedica à formação de educadores, lideranças locais, e gestão do conhecimento sobre como lidar e interpretar situações que podem ser classificadas como trabalho escravo.